segunda-feira, 8 de novembro de 2010

AVATAR: feito de carne e pedra...

“As palavras são como pedras no meu coração...” Esta foi uma das frases que captei do filme Avatar, que assisti de ontem pra hoje, em dois tempos. A primeira parte acabou após uma cena de duro ataque à tradições e valores milenares de uma tribo, motivado por intenções mercadológicas. Já parecia o fim do filme, e logo o interrompi noutra cena onde alguns guerreiros estavam cabisbaixos, em uma cela prisional. Era domingo a tarde, quando o interrompi.
Voltei ao trabalho na segunda, logo cedo. De volta ao mundo real, após um suspiro pessoal... Uma interseção entre o material e o espiritual, e já me punha diante de desafios integrais de saúde. Em visita a um usuário, ...cheio de pedras no coração..., o assisti por alguns instantes tratá-las, com palavras, como se fossem massa, tentando lhes dar alguma forma que lhe fosse mais confortável... sem muito sucesso. Enquanto o ouvia, eu me perguntava: o que cabe a mim fazer aqui? Ou, o que eu posso fazer por ele...? Me passava na mente os quatro anos de faculdade, e os vinte e oito de vida (sete vezes mais...), os conceitos de família e o valor que tinham na história dele..., a visão holística da saúde determinante no trabalho, e vice-versa...,  as noções de poder e as frustrações daquela pessoa..., a perversidade meritocrática na organização em que se insere... O que fazer? ...
Depois de digerir um pouco, fui almoçar acompanhado por uma amiga. Sentamos lá ao lado de duas estudantes que lamentavam algumas angústias pré-profissionais. Surgiu a pergunta: o que fazer quando o contexto institucional sufoca nosso senso crítico no trabalho?... O que fazer? ...
Após o almoço, voltei ao filme, em uma cena antes daquela descrita, onde um guerreiro é interrompido de uma conexão bi-natural, quando pronuncia a frase de fundo, num cenário caótico: “Eu era um guerreiro que achava que traria paz. Cedo ou tarde, no entanto, sempre temos que acordar...”
Findo o filme, me ponho a escrever... tentando amoldar também as pedras em meu coração... tentando dar alguma forma aos sedimentos que acumulo nessa interseção. O nome Avatar, de origem hindu, faz referência à uma dupla natureza dos seres, como mostra o filme.
Me lembrei hoje de uma época, não tão distante, em que eu também lamentava angústias pré-profissionais... E me lembrei, depois disso, de uma época mais recente em que já me estagnei como pedras, por angústias profissionais... E me vejo então numa realidade presente, em que me ponho de pé e questiono, diante de angústias pessoais. O que fazer?
Não se separa, em mim, o pessoal do profissional. Assim como não se separa o espiritual do material. E se a minha materialidade sem forma e vazia me sufoca em angústias petrificantes, não permaneço no jogo do mercado de trocas e busco uma forma cheia de sentido, num vale de graça.
Dia a dia, com esse vale à frente, tento mudar a forma das pedras que caem de altas montanhas, como rochas imensas e belas, sem vida e sem movimento... É o jogo de méritos que sedimenta pedras no fundo do coração.
Mas no vale sufocante tem muita água, cheia de movimento e cheia de vida! Dá pra lavar o rosto todo dia pra ajudar a acordar. Dá pra amoldar as pedras lá no fundo do coração... e dar forma às palavras pra cuidar da saúde dos outros, como cuido de mim mesmo...

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