segunda-feira, 24 de junho de 2013

Quem precisa de cura?

Participei na última sexta-feira da reunião de uma associação que está se formando em Viçosa com a finalidade de combater a corrupção no município. Embora a idéia não fosse parte da onda de protestos no país durante a semana, a experiência serviu muito bem pra se pensar nossa inserção política. Durante a reunião, enquanto apresentavam experiências de outras associações semelhantes pelo Brasil, um dos dirigentes provocou-nos a pensar que somos todos igualmente corruptos. Para tanto, chamou a frente um dos líderes do movimento colocando-o diante do seguinte dilema: “Imagine-se ao lado da bifurcação de uma linha férrea, tendo às mãos a alavanca que muda o sentido da bifurcação a ser seguido pelo trem. O trem se aproxima em velocidade acelerada enquanto, num sentido da linha bifurcada, sobre os trilhos, encontra-se um trabalhador ferroviário abaixado, e no outro sentido encontra-se um grupo de estudantes distraídos num protesto. O trem inevitavelmente seguirá um dos dois sentidos e você, com a alavanca nas mãos, deve decidir para qual deles. Após pensar um pouco na situação, o cara respondeu: “Eu o direcionaria no sentido do trabalhador ferroviário já que assim o trem atropelaria apenas uma pessoa, e não um grupo. ” Aí o dirigente, após confirmar que esta era a atitude mais ética e correta a se fazer, continua: “Agora imagine se no lugar daquele trabalhador estivesse o seu filho, com cinco anos de idade. Sua decisão deve ser rápida.” O cara hesitou um pouco mas assumiu: “Eu o direcionaria ao grupo de estudantes...”. O dirigente encerrou deixando a lição que pra mudar o mundo é preciso primeiro enfrentar a si mesmo.

É difícil assumirmos, numa postura de humildade, essa nossa condição corrupta... A gente usa todo tipo de subterfúgio pra tirar de si a culpa. Mas o fato é que o mal que nos incomoda tanto lá fora, começa dentro de nós mesmos... Egoísmo/egocentrismo, roubo, ambição desenfreada, cobiça alheia, orgulho, ira... Quais são os seus pecados? Dívidas não pagas, impaciência com os filhos, ou com os pais..., "gatos" com fio de internet, atestados de má fé, trabalhos e provas copiados, desrespeito no trânsito, demagogia, falta de diligência e intrigas no trabalho... A lista é bem maior do que o número de pessoas que a assume. Houve uma ocasião, no início do século XX, em que o jornal London Times pediu que alguns escritores respondessem à pergunta: "O que há de errado com o mundo?" Um deles, G. K. Chesterton, filósofo e cristão católico, respondeu-lhes em quatro linhas:
“Prezados senhores,
Eu.
Atenciosamente,
G. K. Chesterton.” (Ortodoxia)

Aí eu me ponho, então, diante daquele dilema na linha férrea tendendo, é claro, à decisão corrupta. E imagino, associando o fato a um contexto político, se eu pudesse receber algum tipo de orientação popular, um conselho que seja, que me fizesse pensar e assumir a postura que seria ética fazer... Eu me arrancaria os cabelos... me jogava ao chão em prantos e, urrando angustiado... (não sei se realmente conseguiria) faria o correto... agindo contra a minha vontade...
Fonte: V de Vinagre

Ouvi neste domingo uma reflexão sobre um momento auge da vida de Jesus, em que ele passou por experiência semelhante, ou muito pior, no jardim do Getsemani. Jesus, sendo Deus, sabia que estava prestes a ser preso, açoitado e morto pelos soldados romanos. Recolheu-se ao jardim com mais três discípulos e também amigos que talvez pudessem lhe dar algum apoio. Pôs-se a orar, angustiado pelo que o aguardava. Pediu a Deus Pai que, se possível, evitasse o sofrimento que estava para acontecer. Os amigos que vieram em sua companhia dormiram... E ele mais angustiado, repetia “Pai, se for possível, afasta de mim este cálice. Mas que seja feita a sua vontade...” Como é dificil agir contra nossa vontade... Segundo relata a Bíblia, sua agonia era tanta que do seu suor passou a escorrer sangue pelo corpo. Instantes depois chegaram os soldados. Pedro, um dos discípulos, ergueu espada para o defender, ao passo que ele o ordenou de imediato que a abaixasse pois aquilo lhe devia acontecer. Somos ensinados que por este seu ato de entrega e sacrifício, hoje podemos nos libertar desta nossa condição tão falha. Bem... isso quando aceitamos que somos mesmo falhos...

Pois então... quanto a isto, houve outra ocasião em que Jesus, assentado entre pecadores, percebia uns que questionavam por que ele estava entre aqueles, e lhes respondeu alto: “Os sãos não precisam de médico e sim os doentes.” Os doentes... só os doentes precisam de cura... É o que penso quando percebo minha fraqueza... quando me ataca a ira, quando sou tentado à cobiça... Penso logo em assumir o meu erro e ir correndo em busca de cura. Afinal, só quem é são não precisa de cura. E só se eu assumir a minha fraqueza é que posso aceitar alguma ajuda pra fazer o que é certo. Ah! E é claro que só assim eu posso ajudar o outro também. E não me resta dúvida de que este é o caminho para minha vida. E esta é a verdade sobre a nossa sociedade.

2 comentários:

  1. Caro Wilde,

    É curioso ver como a linguagem de Cristo não só bagunça a cabeça dos doutores da lei daquela época, mas também os ouvintes de hoje. Quando escutamos essa passagem, logo nos comparamos com os doentes. E nos vangloriamos de nossa humilde atiture em reconhecer nossa doença. Nesse exato momento nos tornamos os fariseus. O mesmo acontece com o fariseu e o publicano. Achamos que somos o publicano que chora e confessa, nesse exato momento nos tornamos o fariseu que glorifica a Deus por ser o que é. Na minha humilde opinião o único caminho que gera redenção é o reconhecimento de que em todas essas passagens os fariseus somos nós! É preciso reconhecer para receber essa graça! Acho que foi exatamente isso que seu texto me inspirou! Obrigado! Deus abençoe

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  2. A verdade sobre a vida encontra-se oculta sob os mistérios da graça. Podem nos parecer "bons" diversos caminhos, diversas "verdades", diversas caras ou posturas. Mas num momento sutil e feroz, em experiências individuais, nossa concepçao inocente de "bondade" é humilhante e amorosamente solapada pela Verdade, reveladora da maldade de todos nòs. Assumir sua (ou minha) farisaicidade parece um grande passo, e inegàvel, deparados diante do Bem. Nesta condiçao, nossas posturas de auto-negaçao, sofrimento e... protestos (sim... por que nao), numa profunda jornada de fé, nos conduzem pelo caminho da graça. Desaliados disto, nossas posturas representam um miseravel orgulho de quem busca, errante, o controle da propria vida.

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